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segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

De Lisboa a Dakar numa Harley-Davidson

No dia 6 de janeiro de 2014, o motociclista Luís Lopes vai partir rumo a Dakar, no Senegal, na sua Harley-Davidson já bem “experiente”, uma moto pouco usual para quem se mete à estrada rumo a África, mas que, juntamente com o espírito “free biker” de Luís Lopes. Vamos acompanhar essa história aqui no blog.

Metal do Asfalto – Em primeiro lugar, a questão que se impõe é, porquê Dakar? Recorda-nos como surgiu a ideia desta aventura?

Luís Lopes - Por vezes torna-se quase  impossível descrever algo que surge de uma forma tão natural e "madura", numa das muitas fases pelas quais passamos na vida, fruto do que já vivemos, ou queremos viver!... Surge Dakar pelo misticismo, pelo desafio e pela vontade infinita de rolar! Pois: "I just want to meet the (all the) world".


M.A. - Sabemos que 6 de janeiro é a data marcada para a partida, e que há um itinerário delineado até Dakar, mas, depois disso, trajeto e datas de regresso estão ainda no ar. A ideia é mesmo deixar a coisa “rolar” e ver o que acontece?

L.L. - O objetivo é chegar a Dakar. Após a chegada, analisarei, em conjunto com a minha Harley,  estados,  fraquezas, capacidades...  e decidirei o trajeto de regresso. Poderá ser contemplada uma ida ao Mali (eventualmente a Bamako, a capital), e dai seguirei em direção à Mauritânia, não tendo assim que fazer exatamente o mesmo trajeto realizado na ida. No entanto, deduzo estar de volta cerca de um mês, mês e meio depois.


M.A. - Esta não é uma moto comum, é uma Harley, digamos bem “amadurecida” pelos quilómetros e pela experiência. É com certeza uma moto com alma, e com muitas histórias. Sem ela, aos comandos de uma GS, por exemplo, o espírito da coisa seria certamente outro?

L.L. – Certamente. No entanto, em toda a minha vida senti  o gigantesco dever de IR!! Apesar de nem sempre viajar de H-D, já somamos algumas boas centenas de horas juntos, por vezes em zonas rudes para ambos e normalmente sem qualquer tipo de certezas... pois a única certeza nestas viagens é que o dia  só tem 24 horas.  Juntos já partilhamos e  conhecemos um pouco o alcatrão europeu, a magia de África e o cheirinho da Ásia. E é esta partilha que nos coloca num ponto infinitamente próximo um do outro…  é a concretização dos nossos sonhos!
Em relação ao fazer algo do gênero numa GS, claro que o poderia fazer... mas não seria a mesma coisa! Por curiosidade, posso contar que  adquiri uma Ténéré há relativamente pouco tempo, e rolar de Harley é paixão, tudo o resto é diversão.


M.A. - Mesmo sendo uma viagem um pouco ao sabor do vento, há toda uma logística e planeamento a seguir. Que passos foram dados já neste sentido?

L.L. - Todas as minhas viagens são um pouco ao sabor do vento. No entanto, estamos a falar de África, de uma cultura e de um  conceito de vida com regras e condições bem diferentes das europeias, e isso implica uma preparação quase exaustiva. Nomeadamente ao nível dos cuidados de saúde, já fiz algumas vacinas específicas como as da hepatite A, febre amarela, febre tifoide e a pneumocócica. Tenho medicamentos para levar no caso de poder ter uma gastroenterite, alguma infeção e, muito importante, comprimidos para a profilaxia da malária. Um dos meus sponsors, o  laboratório  Pièrre Fabré, patrocinou tudo o que são hidratantes, protetores solares, repelentes e produtos de higiene corporal e dentária. Outro sponsor, a Malvavisão, patrocinou-me também óculos graduados com filtros solares de forma a proteger a minha visão nesta longa viagem. Para além disso, há a vertente burocrática, com a obrigatoriedade do pedido dos respetivos vistos  para a Mauritânia, Senegal e Mali.
Em relação à Harley, está a ser alvo de um "checkup" na Motorcycle Madness, com uma equipa mecânica do mais alto nível de competência e profissionalismo, colocando-a "em grande forma"  .


M.A. - Quando é que os leitores do Metal do Asfalto poderão ler a tua história?

L.L. - Espero estar de volta em meados de fevereiro, repleto de sentimentos, histórias e emoções para partilhar com todos aqueles que, de uma forma ou de outra, assim o desejarem. No entanto, é meu objetivo, apesar de condicionado pelas telecomunicações existentes "lá para baixo", partilhar via Facebook as minhas vivências desta minha viagem.
Não posso terminar sem referir, como um amante das viagens e da descoberta do Mundo, que “a melhor bagagem de um homem são as suas memórias!”



segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Relato da viagem ao Vale do Catimbau, Buique - PE em 28/07/2012

Nosso amigo Leonardo Castanha, o Léo, fez uma viagem ao Vale do Catimbau em Buíque com sua moto XRE 300 e nos relata com detalhes, a sua viagem.


Existem maus hábitos que são difíceis de se mudar.. Este é o caso da "protelação infinita" que ocorre quando você pretende fazer algo (no caso uma viagem), daí vai passando o tempo, e nada.. Às vezes até esquecemos! Não poderia deixar que isso ocorresse sobre a viagem de motocicleta até o Parque Nacional do Vale do Catimbau, Buíque - PE. O Vale do Catimbau fica localizado no sertão do estado, tem 62.000 hectares e detém o título de segundo maior sítio arqueológico do Brasil (o primeiro é a Serra da Capivara no Piauí), partindo do Recife são 300 Km.

Sexta-feira, dia 27/07/2012 (dia do motociclista) estava vendo fotos, vídeos e relatos de viagens em sites de todo o mundo e ao mesmo tempo conversava via bate-papo do Facebook com o José Carlos Manuel, que está em viagem desde janeiro de 2010 e hoje se encontra na Guatemala com o seu projeto "Odisseia Pessoal", ele viaja numa XRE 300. Daí veio o estalo... Vou pro Vale do Catimbau amanhã! Já estava estudando essa viagem há algum tempo, porém sempre protelando... Arrumei mochila, barraca etc.. e no sábado, 28/07/2012 às 10h estava deixando o apartamento no bairro do Janga, Paulista - PE com destino ao Vale do Catimbau, Buíque - PE.
Pego a rua José Pereira de Oliveira (vulgo mané pá) e já a esta hora existem pessoas nos bares, muito som alto, transito e todas as outras mazelas típicas dos centros urbanos. Pelo menos por este final de semana estarei livre disto, pensei.. Sigo pela PE 22, PE 15 e BR 101 rumo a BR 232 que infelizmente encontra-se duplicada somente até São Caetano. A rodovia está em bom estado e com o transito fluindo bem, consegue-se manter velocidades superiores a 120 Km/h por longos trechos; uma ultrapassagem aqui outra ali (sempre reduzindo antes), senti pela primeira vez profunda emoção pilotando a Bicuda (XRE 300), são bons momentos que passamos com nossa motocicleta e que nenhuma outra poderá substituir; as próximas guerreiras deverão nos dar novas emoções é claro, porém o que senti nesse dia com a Bicuda vou lembrar por toda a vida.


A parte que mais gosto da BR 232 são as curvas da Serra das Russas, o ar por lá é mais puro e o friozinho indica que estamos de fato no agreste. Segue-se nessa tranqüilidade somente ate São Caetano, onde de repente você vê uma sinalização no chão indicando desvio à esquerda e num piscar de olhos já é mão e contramão, a mudança é muito brusca... Num momento você esta numa velocidade de cruzeiro de 100 a 130 km/h e passa a 70 e 90 Km/h. Algumas lombadas podem te pegar de surpresa também, pois como falei, a mudança é muito brusca e leva-se um certo tempo para nos adaptarmos; muitos animais mortos nos acostamentos entre arcoverde e Buique, tem pra todos os gostos: cavalo, vaca, burro, bode, cachorro, gato, rato... Varios caminhoes lentos criam o que eu chamaria de "congestionamento ambulante", embora você esteja andando a 70/80 Km/h essa velocidade nao está de acordo com uma BR.
A rodovia é bem sinalizada quanto aos lugares considerados seguros para a ultrapassagem, porém é fácil ver carros ultrapassando por exemplo: numa subida e em casos extremos até nas curvas! Também podemos ver filas de carros (em número nao inferior a cinco) ultrapassando um caminhao ao mesmo tempo; existem ainda aqueles que calculam errado a ultrapassagem e querem voltar de qualquer maneira (pra nao bater de frente com o carro da contramão, dentre outras possibilidades..), estes entram em qualquer brecha que avistem... O número de capelinhas indicando o local onde alguns faleceram vitimados por acidentes na estrada também assustam.. Faz você redobrar a atenção sobre os animais e os outro carros, pois eu é que não quero ganhar uma capelinha só pra mim na beira de uma estrada... Fui com esse sentimento até o centro de Buique. Chegando lá, é fácil ver o giradouro que dá acesso a PE 270 que liga o centro de Buique a estrada de terra para a Vila do Catimbau; são 11km de "off road" que não faz medo algum as customs e esportivas, dá pra passar tranquilo. Cheguei por volta das 15h na entrada da vila. logo sente-se a mudança de ritmo das pessoas; comprei uma água no mercadinho, mais pra puxar conversa e informações que pela sede em si... Me indicaram a associação dos guias, fui atendido muito bem pelo guia Genivaldo, me deu todas as informações mesmo já estando próximo de fechar; sao varias trilhas e o custo é de R$ 50,00 por pessoa, tem trilha que só inicia apos um percurso de 11 a 18 km de carro e existem tambem aquelas mais "light" que começam por ali mesmo.
Depois das informações fui procurar o Paraíso Selvagem, lugar de camping e onde pessoas da regiao/turistas vão passar a tarde, por lá também existem trilhas pra fazer. Fui recebido pelo Iran, um adolescente de 16 anos, paguei os 20 reais do camping e me deixou entrar, me mostrando de qualquer maneira os lugares possíveis de armar a barraca. Fui armando a barraca e observando as pessoas que vem passar a tarde, conversavam alto.. além de serem responsáveis por um som alto de caro. Hiiii... rodei 350 km pra nada! Bom, já diz o ditado "já que esta no inferno, abraça o demônio". Armei a barraca, coloque as coisas dentro, peguei os valores e fui explorar o lugar; queria tudo aquilo só pra mim, ali tinha gente demais.. Procurava me afastar.. cheguei até o inicio de uma elevação, gostei do estilo do banheiro! Subi na grande formação de arenito e as vozes já pareciam mais longe, quase imperceptíveis; e que vista do sol já baixo! Vi a pedra do cachorro relativamente perto, tá melhorando... Fui até o topo da pedra, reconhecendo cada palmo, queria mesmo era acampar lá em cima! Vou buscar a barraca... Nao era permitido... Sentei e comecei finalmente a respirar ar puro e entrar na verdadeira atmosfera do lugar. Em pouco tempo os visitantes foram embora e ja nao havia mais som, tudo calmo... O sol já estava mais baixo, Vou ver o pôr do sol! Isso me pegou de surpresa.. Sentei e vi o pôr do sol mais bonito da minha vida! Nesse momento o bem venceu o mal e já nao lembrava mais da impressão anterior; limpei minha mente e nao pensava mais em nada, uma leveza só! Desci já escurecendo, pois queria aproveitar até o final aquela sensação.

 
Na descida dou de cara com um rapaz meio ofegante me perguntando se era meu um carro com placa de olinda; estava com um grupo que precisava de uma carona pra voltar pra Recife, disse que o carro nao era meu e que estava de moto.. Conversamos um pouco, disse que me conhecia de Olinda e que conhecia Caio Lima, reconheceu a camisa do grupo Rua do Absurdo. Falou que havíamos conversado sobre literatura no Bar Aritana em Olinda, bem fácil ter ocorrido... Conheci sua namorada, estrangeira, de sotaque espanhol, não perguntei a origem. Chegaram mais três garotas e conversamos mais um pouco, me convidaram pra passar na barraca deles mais tarde, aceitei o convite e me despedi pra ir na vila. Tinha que avisar que havia chegado, meu ultimo contato tinha sido em pesqueira; no Catimbau nao tem sinal de celular (de nenhuma operadora), as meninas me disseram que o açougueiro tinha um celular ligado a uma antena que permitia fazer ligação mediante certo valor, ninguém me informou sobre isso na vila... Decidi comprar cartão telefônico, nao encontro.. O lugar onde vendia tava faltando, outros indicados estavam fechados ou diziam que nao vendiam o tal meio de comunicação. O guia Genivaldo me cumprimentou, perguntei sobre o cartão, novamente nao sabia, perguntei como usavam o orelhao, disse que ligavam a cobrar! Hehehe.. Boa idéia! Me ensinou a ligar a cobrar, fazia tempo que nao ouvia aquela gravação com a moça falando: "chamada a cobrar, após o sinal diga seu nome e a cidade de onde esta falando", liguei pra todo mundo, hora nao funcionava hora ninguém atendia... Pronto, agora todos devem estar pensando que estou morto! O rapaz do mercadinho me emprestou seu cartao; agora vai, pensei.. Que nada... Nenhum orelhao funcionava o tal cartao.. Dava sempre cartao recusado! Decidi desistir... Já voltando pro camping por volta das 20h, avisto cadeiras, telas de computador e uma legiao de adolescentes numa casa de esquina. Não acredito.. Era uma Lan House! Entrei no facebook e postei: "Cheguei no Vale do Catimbau desde às 15:30h mas aqui nao pega cell e nenhum orelhão funciona.. Ta tudo certo, amanha vou fazer trilha pela manha!". Ufa agora descansei...


Cheguei no camping e fui ter com os anfitriões, não conversamos muito. Hora de ir.. "Amanha tenho que acordar cedo para aproveitar o dia". Entro na barraca e até então não sentia frio, mas depois de uns minutos o bicho pegou! Pense num frio! Foi casaco, calça, meias, cobertor e nada... A barraca estava ao lado da bica e a umidade gigante contribuía ainda mais pro frio; as coisas dentro da barraca pareciam molhadas, logo ao colocar a calça senti que ela estava de fato úmida o que em principio aumentou o frio, mas depois o calor do corpo secou.. Foi a noite inteira assim, piorando com a madrugada. Acordei as 9 e o frio continuou, coloquei o casaco da capa de chuva pra sair.. Desmontei a barraca e deixei tudo pronto pra voltar logo após a trilha. Iria na cidade ver com os guias qual seria a melhor opção, mesmo achando um pouco caro R$ 50,00 pelo serviço pois tinha em mente que seria uns R$ 30,00... Mas já que estava lá, mais vale o ditado "já que esta no inferno... ".
Estava arrumando as coisas quando Iran veio conversar, comentei que achei um pouco salgado a trilha com o guias da associação.. Iran deu uma volta e disse que fazia por R$ 30,00 a trilha de duas horas e meia, iria conhecer todos os atrativos e nao precisaria sair de lá com a moto. Seguimos pra trilha! Mas nao antes do índio Jurandir contar sobre seu passado, pois está lá desde a década de 70, falou dos fósseis encontrados ali na área em que estávamos, contou das outras trilhas; a de três dias andando e acampando no mato me interessou muito, essa vai bater proximo de Paulo Afonso na BA. Começamos a trilha, gostei já da parte de baixo onde conhecemos a caverna, o cemitério indígena, a pedra da "pata de cavalo" e os vestígios de inscrições rupestres. Estava bem ali do lado e perdia todas essas belezas, isso me fez pensar em quantas coisas deixamos de conhecer, quantos anos perdemos das nossas vidas na mesma cidade, convivendo com as mesmas pessoas, indo sempre aos mesmos lugares etc... A coisa melhorou ainda mais na subida da serra, ufa cansei! Parada pra água e doce pra recuperar as energias, ficou claro meu despreparo físico, tenho que fazer exercícios... Descemos por outra trilha mais amena, cansado, mas feliz! Após a trilha tomei um belo banho de chuveiro de água mineral que brota na própria região, a água é fria, mas saía em abundância e com ótima pressão (deve vir da parte de cima da serra); arrumei a mochila, tirei algumas fotos me despedindo em seguida de Junior, de sua mãe, de um outro garoto da região e de Iran (nao falei com o Indio Jurandir pois ele havia saído). Peguei a estrada às 13h do domingo. Segui viagem muitíssimo satisfeito com o lugar, com a moto (pela sua desenvoltura/economia) e sobretudo comigo mesmo, pois havia dado um passo evolutivo sobre aquele "mau hábito".